Posso não saber flamengo mas sei as palavras francesas essenciais para sobreviver na Bélgica: “chocolat” e “bière”. As palavras “croissant”, “baguete”, “necessaire” e “mezzanine” poderão também ser úteis durante a viagem.
Chegámos a Bruxelas, mais tarde do que previsto devido ao atraso do voo, e fomos largar as malas em casa para começar a fazer o reconhecimento da zona. Encontrámos o bar mais próximo, o minimercado aberto até de madrugada e o café Lisbonne, ideal para ver o jogo Portugal x Espanha.
No dia seguinte partimos rumo a Bruges. É uma bela cidade medieval onde é possível dar passeios de barco pelos seus canais ou andar pelas ruas numa charrete. Nós fizemos a tour dos chocolates, onde entrámos em todas as chocolatarias sem comprar nada mas provando todas as amostras que nos quiseram oferecer. Numa esplanada quis experimentar cerveja de cereja e saiu-me o caroço.
Entrámos no comboio de regresso a Bruxelas já quando ele estava prestes a partir. Pouco tempo depois a senhora revisora aproximou-se de grupo de espanholas que estavam sentadas à nossa frente. Ao que parece estávamos na carruagem de primeira categoria e elas, tal como nós, tinham bilhete de segunda. Sinceramente para além do número 1 que estava na porta não notava grandes diferenças da segunda. Não havia ninguém a servir champanhe e as cadeiras não faziam massagens. A antipática revisora obrigou-as a pagar multa, que pelo que percebi seria de 50 euros. Uma jovem espanhola exclamou que assim já não teria dinheiro para jantar. Nessa altura o comboio parou e ela teve que sair da carruagem. Nós aproveitámos e sem olhar para trás seguimos até à segunda carruagem de baixa categoria e sentámo-nos. A insensível revisora acabou por chegar aos nossos novos lugares, viu os bilhetes e seguiu caminho.
Começou o jogo de Portugal e o café Lisbonne estava muito bem composto. Portugueses, belgas e até três espanhóis vestidos a rigor estavam com os olhos colados ao ecrã e com Super Bocks na mão. O filho adolescente do casal português dono do café saltava, gritava e ia trocando umas palavras com os adeptos espanhóis. O pai não gostava e ia repreendendo o rapaz sempre que podia. O Ronaldo marca e a casa vai abaixo. À minha frente estava um senhor bastante parecido com o Tony Carreira. Parecia ser um irmão que decidiu não plagiar e emigrou para a Bélgica para ser trolha. Chega o intervalo com Portugal em vantagem e o pai que tanto criticava o filho já estava com um chapéu de Joker com as cores de Portugal na cabeça e um apito que emitia um som muito similar a uma vuvuzela.
A segunda parte não começa bem para Portugal e a Espanha consegue dar a volta ao marcador. O ambiente acalmou significativamente e o rapaz já nem estava muito interessado em ver o jogo. Mas o nosso CR7 tinha guardado para o minuto 88 um livre só à altura dos melhores do mundo e a casa vai abaixo. Volta a buzina a tocar e aparecem ainda mais bandeiras portuguesas. Foi um empate que soube a vitória e os adeptos espanhóis saíram do café mal o jogo acabou.
Fomos ao Centre Belge de la Bande Dessinée, à Grand’ Place, passámos por uma multidão ansiosa por tirar uma selfie com uma pequeníssima estátua de um rapaz a fazer xixi e vimos uma quantidade considerável de polícia armada.
No final já posso dizer que fui a Roma e não vi o Papa, estive em Berlim e não comi nenhuma bola e agora passeei por Bruxelas mas não vi nenhuma couve. Merci Belgique.
Já chegámos algo atrasados porque só quando entrámos na linha vermelha é que descobrimos que a estação do metro para o aeroporto estava encerrada. No ecrã das partidas nem sinal do nosso voo. Perguntei ao senhor da Ryanair e ele jurou que o voo não tinha sido cancelado mas que não sabia o porque de não estar a aparecer no ecrã.
Passámos pelo controlo sem problemas e quando voltámos a olhar para o monitor ainda não havia sinal dele. Será que estamos no dia certo? Será que me enganei numa letra e afinal marquei para Julho? Não terei reservado para dois mil e dezanove? Várias perguntas pertinentes passaram pela minha cabeça até à altura em que encontrei alguém da companhia aérea. O avião já tinha chegado mas devido a complicações no espaço aéreo só havia slot para levantar às seis e meia. O relógio ainda só estava prestes a chegar à uma.
Tinha tempo mais que suficiente para explorar o “enorme” terminal dois. Podia lembrar-me de comprar pastilhas, queixar-me do preço da água, andar às voltas com o carregador na mão até que alguém próximo de uma tomada se decida levantar ou até encontrar uma slot para o avião. Chamaram os passageiros do avião e entregaram um voucher de cinco euros e uma lista com os nossos direitos e as páginas web onde podíamos reclamar. A possibilidade de receber quatrocentos euros de compensação por um voo que tinha custado pouco mais de vinte euros parecia ser bastante fofinha. Senti bastante orgulho por ter conseguido comprar uma sandes e uma água e não ter ultrapassado os cinco euros. Uma hora depois lá conseguiram arranjar a dita da slot e sonho da querida compensação monetária foi direito ao triângulo das bermudas para nunca mais voltar.
O verdadeiro low coster não paga mais para ir sentado ao lado da companhia de viagem por isso ficámos separados. O meu lugar era junto ao corredor e uma senhora de parcas palavras ficou à janela. Não havia ninguém no meio. Rapidamente a senhora achou por bem colocar-se mais à vontade e esticar as pernas no lugar central. Tinhas as unhas pintadas de azul. À minha frente uma senhora já ia na segunda garrafita de vinho.
Ainda acabei por ajudar a vizinha do lado a tirar e transportar a sua mala para fora do avião e assim descobrir que ela era portuguesa e que o seu filho ter-nos-ia dado boleia se o voo não se tivesse atrasado.
Dia de Primavera Sound. Todas as previsões do estado do tempo apontavam para o que seria o primeiro banho musical do ano mas mesmo assim decidi arriscar. O meu horóscopo garantia-me que seria um dia sem qualquer tipo de adversidade.
No comboio o maquinista anunciava a próxima paragem e alertava para o cuidado a ter ao sair. Em inglês apenas dizia: “Next Stop”. A surpresa do degrau era exclusiva a turistas. A cidade Invicta aproximava-se e ela trazia nuvens carregadas. Na estação da Campanhã não chovia mas o Andante encarregou-se de me transportar para a chuva.
O “Singin’ in the Rain” pode ser muito giro quando estás no sofá da tua casa mas deixa de ter piada quando estás na rua à espera na fila para comer e beber. Espero que a primeira música do Nick Cave seja a adaptação “Push the Clouds Away”.
Quando entra em palco a chuva parece dar tréguas. Quando começa a tocar a “Tupelo”, imagens de furacões e tempestades passam por de trás dos músicos e a chuva começa a se intensificar. O São Pedro deve estar a adorar o concerto. À minha frente, o que parece ser pai e filho adolescente, estão em competição para ver quem é mais ativo nas redes sociais. Tiram fotos e filmam tudo e mais alguma coisa. Até houve Lives no Facebook. Durante o “Into My Arms” decidem abrandar e abraçar a música. É dito em alto e bom som um “Sai da frente ó gorda!” na altura em que Nick anda pela multidão porque está uma senhora às cavalitas a tapar o angulo de visão.
Magnifico concerto. Só no final percebo que estou algo encharcado mas ainda preciso de meter a primeira e dirigir-me até ao palco Seat para ver The War on Drugs e depois voltar onde acabei de ser feliz para ver Mogwai.
Valeu bem a pena. Que venham mais banhos destes. Continuo a sentir a pulseira no pulso e ainda não tirei o impermeável.
Tenho andado numa relação duradoura com a Pubalgia. No início pensei que fosse apenas algo passageiro mas à mínima distração ela dá sinal que veio para ficar. A nossa ligação é tão intensa que por vezes é preciso por algum gelo na nossa relação. Passou a ser a minha Puba.
Existe um grande problema entre nós. A Puba não gosta de desporto. Ela consegue mostrar todo o seu desagrado durante um jogo de futebol entre amigos, numa corridita de poucos quilómetros ou simplesmente num chuto a uma bola para o Oscar ir buscar.
Mesmo assim consigo dar umas voltas com ela sem sair do lugar. Ultimamente tem sido dez minutos sentado na bicicleta e cinco a pedalar levantado. A arte de andar sem sair do lugar tem muito que se lhe diga. Só à terceira tentativa é que consegui caminhar na passadeira sem ninguém a segurar-me. É como aprender a andar novamente mas infelizmente ninguém filmou os meus primeiros passos. Ganhei todo um novo respeito pelos membros da banda OK Go.
Com o passar dos dias a força da nossa relação tem diminuído, mas sempre que tento fazer algo com maior celeridade ou algum número circense ela faz questão de assinalar a sua presença. Puba, já andamos há algum tempo juntos mas agora preciso do meu espaço. O problema não és tu, sou eu.
Há dias para tudo e mais alguma coisa. Para além dos clássicos Dia do Pai e Dia da Mãe existe também o Dia dos Irmãos, o Dia dos Avós, o Dia das Famílias e o Dia dos Vizinhos. E para complicar a agenda há datas que são diferentes no Brasil. Existe assim o risco de partilhares um texto bastante fofinho sobre o teu irmão, acompanhado com uma foto de quando eram pequeninos e só depois perceberes que o Dia dos Irmãos em Portugal é em Maio e não em Setembro.
Os nomes também têm dias. Existe o dia do António, do Filipe, da Catarina, da Raquel e de certeza que também há o dia do Estanislau. Acabas por ser identificado numa publicação do Facebook que assinala o dia do teu nome e no Dia Mundial do Barrigudo.
Dia 21 de Março é dia Mundial da Floresta, Dia Mundial da Árvore, Dia Mundial da Poesia, Dia Mundial da Eliminação da Discriminação Racial e Dia Mundial do Sono. Torna-se assim o dia ideal para estar numa floresta a escrever poesia e no final escolher uma árvore, sem discriminar nenhuma apenas pelo seu aspeto, e tirar uma soneca.
O dia 27 de Março é Dia Nacional do Dador de Sangue, Dia Mundial do Teatro e Dia Internacional do Circo. De manhã fazes um grande drama, na altura de ir dar sangue, por não gostares de agulhas mas de noite, depois de uns copos, estás decidido em enfiar a cabeça na boca do leão.